quarta-feira, 31 de outubro de 2012

«Há fortes indícios de corrupção na implementação da TDT»

Investigador diz que PT foi de longe a mais beneficiada e lança suspeitas sobre isenção da Anacom no processo.



O investigador da Universidade do Minho Sergio Denicoli afirmou esta terça-feira que há «fortes indícios» de corrupção na implementação da Televisão Digital Terrestre (TDT) em Portugal e sublinhou que o processo foi conduzido de forma a «não funcionar».

«Houve uma TDT planeada muito diferente da que foi implementada. Foram prometidos, por exemplo, muitos canais, mas ficou-se apenas pelos quatro que já existiam no analógico. Isso ocorreu por interferências políticas e económicas, o que nos leva a crer que pode ter havido a captura do regulador pela Portugal Telecom [PT], ou seja, a Anacom teria trabalhado em favor da PT», disse à Lusa o investigador.

Sérgio Denicoli defendeu esta terça-feira, na Universidade do Minho, a sua tese de Doutoramento em Ciências da Comunicação, especialidade de Sociologia da Comunicação e da Informação, intitulada «A implementação da televisão digital terrestre em Portugal».

O investigador sublinhou à Lusa que a PT foi, «de longe, a principal beneficiada» com a TDT, tendo conseguido 715 mil novos clientes para a MEO.

«Naturalmente, não interessava à PT que a TDT tivesse muitos canais e a entidade reguladora [Anacom] permitiu isso, beneficiando grupos económicos em detrimento do interesse público», referiu.

E acrescentou que, segundo a organização não-governamental Transparência Internacional, esta atuação configura «uma espécie de corrupção, pois utiliza algo público de forma a garantir lucros privados».

«Não posso afirmar categoricamente que houve corrupção, pois cabe à Justiça tal constatação, mas posso dizer que há fortes indícios e que é importante que as autoridades competentes façam uma averiguação», acrescentou.

O investigador disse que as questões técnicas não foram devidamente explicadas à população, numa estratégia «deliberada ou não» que serviu para «legitimar decisões contrárias ao interesse público», beneficiando sobretudo «grupos económicos, cujos laços com o poder político são evidentes».

«No caso da Portugal Telecom, que receberia o direito de utilização de frequências da TDT, a ligação era mesmo simbiótica, oficializada por meio de golden shares do Estado na empresa e também através de ações da PT detidas pelo banco público Caixa Geral de Depósitos», afirmou.

Segundo Sergio Denicoli, a TDT que existe hoje em Portugal «foi feita para não funcionar, para apresentar falhas, para oferecer poucos canais e serviços interativos limitados, de forma a incentivar a migração da população para serviços de TV por subscrição».

O investigador referiu que, somente no período de implementação da TDT (2009 a 2012), a TV paga em Portugal cresceu mais de 32,3%.

«E estamos a falar de um período de crise económica. Isso, certamente, deve-se à fraca oferta da TDT. Hoje, o que verificamos é que o sinal da TDT apresenta falhas constantes, devido a erros técnicos que poderiam ser evitados», apontou.

Para o investigador, em Portugal, ao contrário do que acontece noutros países da União Europeia, «as autoridades públicas legislaram respondendo primordialmente aos interesses empresariais» e não se preocuparam sistematicamente com a população ou com a inclusão digital.

O país «não aproveitou a tecnologia disponível para proporcionar às pessoas uma televisão em sinal aberto de qualidade equiparável aos serviços de TV por subscrição, mesmo havendo plenas condições para tal», considerou.

«Os lóbis económicos, que, no caso português, parecem ser intrínsecos aos lóbis políticos, conseguiram fazer com que fosse estabelecido um modelo de TDT de qualidade muito inferior ao apresentado pela maioria dos países da União Europeia e muito aquém do que os operadores de TV paga ofereciam aos seus clientes», criticou.

IN: Agência Financeira

ANACOM já recebeu oito mil queixas por causa da TDT

Até ao início de Setembro, a Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) recebeu cerca de oito mil queixas relacionadas com o processo de implementação da Televisão Digital Terrestre (TDT). Destas, duas mil foram reencaminhadas pela Associação de Defesa do Consumidor (DECO).



Segundo ambas as entidades, a maioria das queixas está relacionada com a falta ou instabilidade do sinal digital. Ilda Matos, porta-voz da ANACOM, esclareceu ao PÚBLICO que as queixas derivam de “problemas relacionados com instalações de equipamentos”.

A ANACOM vê estes problemas como “excepções” e considera-os “pouco significativos” perante um processo que “correu bem”. Versão que a coordenadora do departamento jurídico da DECO, Ana Cristina Tapadinhas, rejeita por completo. A implementação da TDT foi um “processo pouco apelativo aos olhos dos cidadãos” devido à “falta de informação”, sublinha a representante da DECO.

A DECO faz uma “avaliação negativa do processo” e atribui “responsabilidades tripartidas ao Governo, PT e ANACOM”. Por isso, Ana Cristina Tapadinhas considera que o processo não está terminado e exige que seja feito um estudo independente sobre a implementação da TDT, por questões de “transparência e de equidade”. A associação critica também a falta de divulgação do número de consumidores que beneficiaram da mudança.

O sinal analógico foi desligado a 26 de Abril deste ano, mas os concursos para pedido de comparticipações financeiras estão abertos até ao dia 31 de Dezembro.
IN: Jornal "Público"

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

TDT: Concelho de Almodôvar continua com sérios problemas de captação

 
É simplesmente vergonhoso. Na freguesia de Santa Cruz, Almodôvar não há sinal TDT há um mês. Se antes era possível visualizar as emissões desde o emissor de Castro Verde, a menos de 30 km em linha recta, tal deixou de ser possível há cerca de um mês sem razão aparente. O mesmo problema verifica-se por todo o concelho de Almodôvar incluindo na própria vila, local em que existe um emissor TDT com uns miseráveis 45 wats de potênica. O de Castro Verde tem 650.1 Wats.
Esta situação de falta de sinal sempre se verificou, mas de há um mês a esta parte não é possível visualizar a TDT em qualquer altura do dia ou da noite. Curiosamente, a TDT espanhola, cujo emissor está a 130km em linha recta, entra na Telhada, Almodôvar com um sinal de 100% sendo possível captar as emissões do país vizinho com os seus 40 canais gratuitos!.
Na imagem abaixo mostrada podem observar que a antena instalada no topo do mastro é a que se destina a captar a TDT portuguesa (Teka Diga), com o emissor a menos de 30km. Sem sinal em permanência! A antena mais baixa é a que está apontada a Espanha, uma antena de menor qualidade (Mandarim) e instalada a baixa altitude, inclusive com uma orografia difícil pela frente, não tem problemas em captar as emissoes de Espanha...
Recentemente a Junta de Freguesia de Santa Cruz, e após a entrega de um abaixo-assinado levado a cabo na freguesia e no concelho, recebeu a garantia do Ministro Miguel Relvas de que o problema na freguesia Santa Cruz e no concelho em geral seria resolvido no espaço de um mês... já lá vão quase 3 semanas e nada... antes ainda se via algo das 9h da manhã até perto das 19h... agora nem isso... Que vergonha!
 

 
Instalação na Telhada, freguesia de Santa Cruz, Almodôvar

Governo admite manter RTP2

O Executivo volta a recuar e admite agora manter a RTP2 independentemente do futuro do primeiro canal. A notícia é avançada pelo Diário Económico e Antena1.

Citando uma fonte governamental e fonte da administração da empresa pública, os dois órgãos de comunicação dão conta que a decisão de encerrar o segundo canal foi agora posta de lado. Ainda assim, vai manter-se o corte ao financiamento da estação.
Contactado pelo CM, o gabinete do ministro dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas - que tutela a RTP - afirma apenas que "nada está decidido" quanto ao futuro do grupo RTP.
Recorde-se que o economista António Borges, consultor do Governo para as privatizações, tinha avançado numa entrevista à TVI que a solução para a televisão pública iria passar pela concessão da RTP1 a um grupo privado e a alienação do segundo canal.

IN: Correio da Manhã

Portugal pode ter mais canais TDT

Portugal pode ter mais de trinta canais na Televisão Digital Terrestre (TDT), alguns deles em alta definição, desde que o espectro radioeléctrico que sobrou com o fim da televisão analógica seja cedido aos operadores televisivos, apurou o CM.



A Anacom (Autoridade Nacional de Comunicações) pediu aos operadores e ao Regulador dos media que se pronunciassem sobre a matéria para informar Bruxelas sobre o que Portugal pretende fazer com o seu dividendo digital.
"A ERC deve assegurar que a União Europeia reserve espaço suficiente para as televisões; caso contrário, e porque é tendência , começa o ‘namoro’ das empresas de telecomunicações para o ocupar", diz ao CM Arons de Carvalho, vice-presidente da ERC (Entidade Reguladora para a Comunicação Social).
Opinião é partilhada pela vogal Raquel Alexandra: "Tem de haver uma decisão que não seja irreversível, porque isso seria hipotecar a actividade futura das televisões", considera.
Para a vogal, em "nenhum momento pode ser colocada em causa a capacidade de os operadores de televisão crescerem para a alta definição ou para a criação de novos canais fora do cabo, na TDT".
Fonte da Anacom disse ao CM que os canais que estão hoje na TDT – RTP 1, RTP 2, SIC e TVI – ocupam "pouco espaço", sendo que algum do espectro que sobrou aquando do ‘apagão’ analógico já foi ocupado com a tecnologia LTE (quarta geração móvel – 4G), vendida aos operadores de telecomunicações.
 
IN: Correio da Manhã - 24/10/2012

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

MFN vai chegar ao Alentejo

 Emissor do Mendro (Vidigueira) - Foto: José Moreira

A instabilidade da rede SFN da TDT em Portugal Continental é uma realidade. Os canais 42 (Monte da Virgem), 46 (Lousã) e 49 (Montejunto) em muito vieram contribuir para a melhoria da receção de sinal TDT em muitas localidades. No entanto os problemas persistem em muitas outras localidades devido à interferência do canal 56 entre os vários emissores existentes. Paralelamente a estas anomalias e como prova da capacidade de propagação deste tipo de sinal, são o exemplo de relatos de instaladores que em determinadas ocasiões em que as condições atmosféricas assim o permitiram foi a identificação de sinais TDT de Marrocos presentes no Algarve, o Mux da TDT da Madeira na Figueira da Foz, e sinais da TDT da vizinha Espanha identificados em várias cidades da costa ocidental portuguesa.
Portanto, a variação da propagação ao longo do tempo é um facto e já não existem dúvidas que a implementação de uma rede SFN em territórios da dimensão de Portugal Continental não é viável devido às interferências constantes entre emissores mais distantes. A solução passaria sem dúvida pela criação de uma rede MFN onde poderiam prevalecer sem qualquer problema várias redes SFN, mas com cobertura de território apenas “regional” de forma a estas não serem interferiveis. Como bom exemplo disso são as regiões autónomas dos Açores e da Madeira, onde estão igualmente implementadas redes SFN, mas de menor dimensão e à qual não existem relatos relativamente a possíveis instabilidades na receção do sinal.

SFN: Single frequency network

MFN: Multi-frequency network

Texto: Informativo Televés. Foto: José Moreira


O TDT no Alentejo, apurou que em princípio o emissor do Mendro vai funcionar em MFN, desconhece-se a futura frequência a ser utilizada, também conseguimos apurar que o número de painéis neste emissor vai ser aumentado. Resta-nos esperar e pedir aos nossos leitores que nos informem sobre eventuais alterações das emissões TDT no Alentejo.


sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Castelo de Vide já tem emissor TDT

Emissor TDT - Castelo de Vide
 
Portugal estava coberto por um conjunto de emissores de grande alcance, o emissor da Serra de S. Mamede, era um dos principais do Alentejo. Agora, com a entrada da TDT, a sua morte era evidente, mas muitos problemas se levantaram, o sinal TDT era fraquíssimo nessa região. Depois, de inúmeras queixas de populares e autarcas junto das autoridades “destinadas” ao controle do espectro e de algumas críticas vindas de alguns políticos, Castelo de Vide, foi mais uma das localidades a receber um emissor TDT. É de referir, que esta localidade estava coberta por um repetidor analógico, agora no topo da antena da PT, junto à Capela de Nossa Senhora da Penha, está um repetidor digital.


Emissor analógico antigo
 
 
Emissor de São Mamede
 

Texto e Fotos: José Moreira - TDT no Alentejo

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Reportagem:“Se me tiram a televisão, tiram-me a vida”

Em seguida publicamos uma reportagem especial produzida pelo jornal "Diário do Alentejo". Vale a pena ler com atenção!



Aldeia Nova da Favela, Messejana e Canhestros são apenas três exemplos de localidades do distrito de Beja onde continuam a registar-se problemas com a migração para a televisão digital terrestre (TDT), passados que estão quase seis meses sobre a conclusão do processo que ditou a cessação da emissão televisiva analógica terreste. As populações queixam-se de falhas frequentes de sinal de TDT, mesmo depois de terem gasto dinheiro em descodificadores, antenas e até televisores. Várias autarquias já procederam ao levantamento das situações concretas de anomalias e tentam agora, através de acordos firmados com a Anacom – Autoridade de Comunicações (a entidade coordenadora do processo de transição) e com a Telecom (a empresa responsável pela instalação da infraestrutura de rede), encontrar solução para o problema.



Texto Nélia Pedrosa Fotos José Ferrolho



Sentado no poial à porta de casa, no Monte da Oliveirinha (Ourique), indiferente ao frio e ao céu carregado de densas nuvens negras, Francisco de Matos faz a barba tranquilamente. Bacia com água e pincel pousados no chão, lâmina de barbear numa mão, espelho apoiado nas costas de uma cadeira colocada à sua frente. Funcionário público aposentado da Câmara Municipal de Ourique, onde trabalhou durante 33 anos nos mais variados serviços – “andei espalhando alcatrão aí por essas estradas, numa máquina, andei abrindo valetas, fui jardineiro no castelo” –, o septuagenário preenche os dias cuidando “do hortejo e de duas ovelhinhas” e ajudando a mulher, atualmente a recuperar de uma cirurgia que lhe deixou algumas mazelas.
Agora que já não saem “para lado nenhum”, porque “a idade” de ambos e os problemas de saúde de Adélia “já não o permitem”, a televisão é uma das principais distrações do casal, principalmente à hora de almoço e ao serão. Adélia delicia-se com a Júlia Pinheiro, “com a forma como ela fala com as pessoas”, e com as telenovelas da TVI. Francisco aprecia as touradas e os noticiários. Mas desde que fizeram a migração para a televisão digital terrestre (TDT), raro não é o dia em que não se deparam com falhas na receção do sinal.
“Fico aborrecido por não se ver nada. À noite, ao serão, às vezes está a dar uma novela, ou outra coisa qualquer que gostamos de ver, e depois aparece um quadrozito, por vezes letras, estamos ali um quarto de hora, meia hora, e a imagem não regressa, então desligamos e vamo-nos deitar, é o que a gente faz. Até já disse à mulher que o melhor é levar a televisão lá além para o balde do lixo, assim acabava-se com isso”, diz Francisco de Matos.
Em “descodificadores, cabos e antenas“, o casal Matos, a filha e o genro, que vivem na casa ao lado, gastaram “cerca de 200 euros”. No caso da filha, acresce à conta uma nova televisão. “Disseram para comprarmos uma televisão das novas, que tem tudo incluído, que se via bem, que não havia problema. Não há problema? Acontece o mesmo que à do meu sogro, que é velha. É a mesma coisa”, lamenta o genro, Alberto Samora.
Do Monte da Oliveirinha avista-se a Aldeia Nova da Favela, também conhecida por Favela Nova, localidade da freguesia de Ourique habitada por poucas dezenas de pessoas, na sua esmagadora maioria idosas e que se distribuem apenas por duas ruas – “a rua principal [rua Engenheiro Sena Cabral] e a rua da Igreja”. Aqui também as queixas de frequentes falhas de sinal se repetem.
Irene Guerreiro, 83 anos, que caiu na tarde do dia anterior, magoando uma perna, repousa na cozinha, impedida que está de fazer grandes movimentos. Se a televisão já lhe fazia companhia enquanto tratava dos seus afazeres domésticos, nos próximos dias ainda lhe deverá fazer mais. “É uma grande companhia, principalmente no inverno, porque sou só eu e o meu marido”, diz entre queixumes de dor.
“Com a perna assim vai ser complicado. Vai passar mais tempo em casa e precisará mais da televisão para lhe fazer companhia. Agora que estou de férias sempre estou mais acessível durante o dia, se não fosse assim só passaríamos à noite”, acrescenta a nora, Inês Ramos de 35 anos, também ela afetada pela falta de sinal de TDT. “Sinceramente custa-me mais por causa das miúdas, uma tem oito anos e a outra tem três. E o meu marido também gosta de ver televisão. Eu não ligo muito, nos telejornais também só dão desgraças. Mas também não estou para por televisão paga, eu e o meu marido não temos ordenado para isso”, conclui.
À Junta de Freguesia de Messejana, no concelho vizinho de Aljustrel, já chegou um número significativo de reclamações a dar conta de dificuldades na receção do sinal de TDT. Edeme Correia, 84 anos, que encontramos na praça 1.º de Julho a caminho da mercearia, é uma das queixosas. Mas não o faz só a pensar em si, porque não é “egoísta”, vai logo avisando. Fá-lo também a pensar nos seus conterrâneos de parcos recursos, que não podem gastar “20 ou 25 euros por mês” por um serviço de televisão paga, neste momento “a única forma de se poder ver televisão sem problemas” [a TDT não afeta os serviços de televisão por subscrição]. “Eu não falo só por mim, falo é pelas outras pessoas, porque graças a Deus ainda podia pagar, mas há pessoas que não podem. Então uma pessoa que tenha uma reforma de 250 euros, pode estar tirando 20 ou 25 euros todos os meses por causa da televisão, e então o resto? Medicamentes e às vezes já fraldas, e essas coisas todas. Tudo custa dinheiro”.
Como durante o dia anda “a serigaitar pelas ruas”, entre “visitas a amigos e a doentes a residir no lar”, é nos períodos em que prepara as suas refeições e ao serão que mais vê televisão, ou melhor, que tenta ver, ironiza. “As falhas de sinal acontecem mais à noite. Mas há três dias que vejo bem. Depois sou capaz de estar quatro, cinco dias sem ver. Vejo um bocado, depois começam aquelas trapalhadas, parece roupa lavada pendurada na corda. E fico sem sinal, acabo por desligar e deixar-me dormir, mas aborrece porque sempre gosto de ver a telenovela ‘Louco amor’, da TVI, e as outras que dão a seguir, assim como o noticiário”. A viver sozinha, há dias em que acaba por ir ver televisão a casa do irmão, que “tem os canais todos”. Mas com a chegada do inverno, e das noites frias, diz, as saídas noturnas acabarão: “Depois não posso vir às 10, 11 horas da noite para casa, que é quando acabam as novelas, porque já está muito frio”.
Com uma modesta reforma e a viver sozinha, Mariana Salgueiro, de 84 anos, é uma das conterrâneas de Edeme Correia que não se pode dar ao luxo de subscrever um serviço pago de televisão. Por isso, quando o aparelho começa a ficar “com listas encarnadas”, aproveita para fazer “um pouquinho de croché, se ainda é cedo”, para ler uma revista herdada de uma das irmãs ou para rezar. “A televisão é a minha companhia, como não tenho gatos, nem gatas, é a televisão. As minhas vizinhas todas, e as minhas irmãs, têm televisão paga, com quarenta e tal canais, mas a mim só me interessam os quatro, e a dois [RTP 2] quase nunca vejo”. Mas pior, diz, estão as pessoas “que moram nos montes isolados”, sem vizinhos por perto. “A gente aqui ainda tem uma vizinha ou outra, mas aquela gente que vive em montes isolados, quando fica sem televisão, vai ver o quê? Isto que fizeram [a migração para a TDT] é, na verdade, uma tristeza”, desabafa.
Marisa Gonçalves, que vive a escassos metros de Mariana Salgueiro, à reclamação entregue na Junta de Freguesia de Messejana acrescenta um sem número de telefonemas feitos para o número disponibilizado pela Telecom (empresa responsável pela instalação da infraestrutura de rede necessária para cobrir todo o País com televisão digital) para tratar de assuntos relacionados com o processo de migração. Num dos últimos contactos foi aconselhada “a comprar mais um aparelho para amplificar a intensidade da rede”, mas mesmo assim ainda teria que adquirir uma antena parabólica “para resolver o problema”. “Nós comprámos uma antena e dois descodificadores, gastámos cerca de 150 e 200 euros. Este novo aparelho de que falaram e a antena parabólica não sei quanto custam, mas eles é que deviam resolver o problema”, diz a animadora sociocultural de 32 anos. Marisa vai continuar a aguardar pela resolução do problema, mas não sabe por quanto tempo. “Sou apologista de esperar mais algum tempo mas se não se resolver em alguns meses terei que optar pela televisão paga”, diz, quase resignada.
Seguimos para Canhestros, no concelho de Ferreira do Alentejo, onde o assunto do dia é o rebentamento da caixa automática instalada na junta de freguesia. Os assaltantes não conseguiram levar o dinheiro mas deixaram atrás de si um rasto de destruição. Joaquim Maia, 49 anos, um dos funcionários da autarquia, mostra-nos as janelas, portas e estores destruídos ao mesmo tempo que vai dando conta da sua experiência com a TDT: “Já mudei de antena, já meti cabos e mais um aparelho que eles dizem que reforça o sinal, nem faço ideia do que já gastei, se calhar uns 200 euros. Às vezes a gente está com a cegueira de ver um programa qualquer e é quando a televisão fica cheia de manchas, vermelhas, azuis, e a imagem a desaparecer. Pode estar assim cinco minutos, como pode estar dois, incomoda e muito”.
O que também incomoda, diz, são os comerciais dos operadores privados de televisão “que insistem, batem à porta das pessoas dia e noite, para as pessoas aderirem”. “Eu não faço intenções de aderir. Mas há pessoas na aldeia que já o fizeram, saturadas que estão de não verem televisão”.
“Se me tiram a televisão, tiram-‑me a vida”. As palavras de Eglantina Moderno, 76 anos, demostram bem a importância que a “caixinha mágica” tem no seu dia a dia. Viúva há 11 anos e com os quatro filhos já independentes, a televisão tornou-se a sua “companha”, a sua principal distração, uma vez que por questões de saúde pouco pode fazer. “Não posso estar muito tempo de pé, são dores nos joelhos, na coluna, em todo lado. Deixei de poder fazer a comida. Sempre limpo o pó, mas pouco, e assim vou indo”, diz, ainda abalada com a notícia da tentativa de assalto à caixa multibanco da sua aldeia.
Os seus gostos televisivos vão da telenovela “Dancing Days”, da SIC – “adoro a minha júlia” [personagem principal] – ao telejornal, embora “pouco” perceba, passando pela tourada, algo que aprendeu a apreciar com o marido. “A graça que isto tem é que eu nem gostava de tourada. O cavalo sofria, o touro sofria, o homem sofria, e eu sou muito coração mole. Mas o meu marido era capaz de ir lá fora se fosse preciso para ver uma tourada, e eu comecei a ver com ele. Então não é que encegueirei? Agora não falho uma, principalmente quando é com o meu primo segundo, o toureiro Luís Rouxinol. Ele é um artista”.



Autarquias identificam centenas de anomaliasOurique, Santana da Serra, Panoias, Garvão e Conceição são as localidades do concelho de Ourique “onde as falhas de sinal de TDT incidem mais”, adianta ao “Diário do Alentejo” o presidente da câmara municipal. “O processo TDT continua com falhas. Há uma zona sombra em que as pessoas têm que adquirir equipamentos de captação via satélite e algumas delas não têm condições para o fazer. Por outro lado, por razões meteorológicas ou por falhas técnicas, há perdas constantes de sinal”. De acordo com Pedro do Carmo, de uma reunião realizada em agosto último resultou um acordo com a PT, sendo que “no prazo de uma semana a empresa irá efetuar em todos os locais que a câmara indicou medições de sinal”. “Depois de chegar à conclusão, caso a caso, se é falta de sinal, e aí temos que ir para a captação via satélite, ou se é algum defeito na instalação, as situações serão ultrapassadas”, assegura, adiantando que até ao momento foram identificadas “três centenas de situações”.
“Preocupante”. É assim que o presidente da Câmara de Aljustrel apelida a situação atual do concelho em termos de receção de sinal de TDT. “Temos muitos sítios do território em que há problemas da mais variada ordem, mas o mais confrangedor é sabermos que são territórios de baixa densidade, com pessoas muito idosas, que não têm a mesma disponibilidade para as novas tecnologias que outras gerações”. Nelson Brito considera que todo este processo acaba por ter “consequências muito graves”: “Volvidos estes anos todos as pessoas não têm direito à televisão, que é de facto um meio de informação por excelência, que em muitos sítios recônditos coloca as pessoas em contacto com o mundo. Retrocedemos 30, 40 anos nesta questão. Temos neste momento sítios onde as pessoas ouvem rádio para estarem ligadas ao mundo”. A câmara, em conjunto com as juntas de freguesia, está a proceder ao levantamento “de situações concretas de anomalias detetadas na receção do sinal da TDT”, que depois encaminhará para a Telecom e para a Anacom, entidades a quem já solicitou reuniões. Até ao momento as autarquias receberam “mais de 600 reclamações”.
O “Diário do Alentejo” tentou ainda obter declarações junto do presidente da Câmara de Ferreira do Alentejo, mas tal não foi possível em tempo útil. NP
Texto e Fotos: Diário do Alentejo